Todos os dias há toda gritaria
A intimidade grita baixinho na voz da dor
A intimidade grita incontida no orgasmo que faz gemer, no êxtase momento de nada temer
A intimidade grita na nudez do velho corpo cansado que um dia se descobre disforme na materialidade do espelho, a intimidade pede licença para um mundo que escancara a desejável privacidade da intimidade
A poesia é o buraco no peito do poeta, a poesia é o bom conselho do profeta, a poesia é a carta que escrevo aqui, inebriada pelo sonho poético de possuir um pergaminho, de oferecer a todo mundo muito carinho, tal qual um passarinho que se chama beija-flor e possui muita força no batimento de suas asinhas, possuo forças nas asas pensantes que trilha nossos caminhos, preciso de todos, crio um mundo fictício, faço das palavras o meu ofício, escrevo para a criança que há em nós, escrevo para o aconchego dos velhinhos, no amontoado das letras em que me perco faço abrigos, construo ninhos, abraço as pessoas, deixo nódoas dos frutos que sugo das bocas que faço escorrer desejos, lambuzo o universo e me vejo em cada ser humano que absorve o milagre da vida, a gritaria, hoje, sempre, num dia qualquer, no dia da poesia
No dia da poesia brinco com os sonhos, ofereço alegrias, faço o meu espetáculo, iludo-me com as possibilidades de transpor obstáculos, tocar os inacessíveis tormentos da alma, afagar os corações lacrados, romper a implacável crueldade da tortura que dilacera a integridade do homem
No dia da poesia, brinco com os sonhos, me dobro aos enganos, cavalgo no meio dos pantanais, carrego todos os sonhos no meu cantil, bebo a salobra água que amarga a vida, aos amigos dou guarida, carrego-os na minha garupa, amarro o meu cavalo na sombra, com as folhas que caem em forma de poesia inspiro-me, com as mãos delicadas escrevo no chão, aconchego cada amigo no meu colo, conto-lhes sobre minha poesia e choro, com minhas lágrimas banho o meu e os seus olhos.
No dia da poesia transcendo minhas falhas, enfrento batalhas internas, espicho minhas pernas e corro para o palácio encantado, deito na rede, derrubo paredes e recebo no dia da poesia, no dia a dia, o ano inteiro a dádiva de poder poetizar!!