Escrevo o texto da coluna, nesta semana, da cidade de Campinas, interior do Estado de São Paulo. Vim para cá realizar um curso sobre Florais de Bach e reencontrar minha mestra, Carmen Monari. Além dela, reencontrei também a Criança interior que vive em mim e a quem dedico o artigo. A proposta do grupo, composto por mais de 40 pessoas, majoritariamente feminino, é compreender “A Criança na consulta floral e sua participação em seu processo de cura e o papel dos pais ou cuidadores”. Estamos aprendendo juntos que para cuidar de crianças (e de quaisquer outras gentes, tenham as idades que tenham) precisamos, primeiramente, perceber a Criança interior que habita dentro de nós e nos acompanha desde sempre. A partir dessa percepção, chegamos às vivências da Criança em nossos históricos de vida, além dos sentimentos e das reflexões, integrando-a ao nosso Pai e à nossa Mãe. Foi revelador perceber que uma das cenas mais antigas presentes em minha memória infantil está relacionada ao meu pai, mais especificamente ao velório do corpo dele, em uma triste manhã de março de 1976. Senti o desconforto de me ver no colo de minha mãe, que chorava com discrição, vestida de luto, ouvindo as pessoas dizerem a mim que meu pai estava apenas “dormindo” e que acordaria a qualquer momento. Por que mentiam? O sentimento de incompreensão tomou conta daquela Criança que meses depois teria catapora e desenvolveria queloides na pele. Marcas do trauma vivido tão precocemente, aprendi a gostar do meu corpo do jeito que ele era/ é, apesar de comentários maldosos e brincadeiras de colegas de classe ou de vizinhos. A Criança cresceu, sem perceber que precisava viver as próprias verdades e nelas permanecer, ainda que as pessoas a sua volta dissessem mentiras. Descobri que uma de minhas “essências florais de tipo” é Agrimony (Agrimonia eupatoria). O palhaço triste que disfarça sua dor agindo como a alegria e a alma da festa é o arquétipo representado por Agrimony. Não que eu me veja como um palhaço sorridente, mas quantas vezes me vi torturado mentalmente, escondendo o sofrimento por trás de um rosto aparentemente alegre. Busquei a aprovação e a admiração daqueles a quem amo, tornando-me um menino estudioso, comportado, perfeccionista e exigente consigo mesmo. Cresci e continuei a buscar reconhecimento e mérito, transformando-me em um profissional exemplar e premiado. E o que fazer, agora, tendo atingido um nível de excelência em uma carreira iniciada há 25 anos? Creio que tenha chegado o momento de perceber o quanto ainda preciso me cuidar, gostar mais de mim, viver as verdades que foram deixadas para trás, perdoar aos que me abandonaram ou me renegaram e, sobretudo, perdoar-me. Sim, caros leitores, a minha Criança interior ainda está à espera de perdão, de aceitação e de afeto. Repetindo padrões do passado, imaginava (equivocadamente) que ao encontrar alguém que dissesse me amar tudo estaria resolvido como em um passe de mágica. Mentiras. Como lidar com elas? Como lidar com o autoengano ou com as próprias mentiras que contamos a nós e para a nossa Criança interior? Mais uma vez alertando-os de que não pretendo ser “guru espiritual” de ninguém ou “receitar pílulas de autoajuda” busco expressar em meus textos o movimento que tenho realizado em direção ao autoconhecimento e à libertação de amarras que, por tanto tempo, me aprisionaram à opinião alheia e à busca por prazeres vazios. O rompimento de padrões repetitivos do passado não é fácil, mas é o primeiro passo para nutrir a minha Criança interior com boas emoções, com amor e muito, muito afeto, além de aceitação e verdade. Em tempos “bicudos” como os que estamos vivendo, em que casais se separam sem ao menos tentarem o enfrentamento da vida com seus dilemas e tensões e em que amizades são descartadas ao menor sinal de descontentamento por uma ou ambas as partes, é saudável cuidar de quem fomos um dia! O pequeno Giovani agradece!