“Os celeiros de fartura/ Sob um céu de puro azul/ Reforjaram em Mato Grosso do Sul/ Uma gente audaz”. As primeiras frases do Hino de Mato Grosso do Sul sempre mexeram comigo e não poderia ser diferente ao ouvi-lo no último final de semana, em que visitei mais uma vez o Estado. O chamo de “meu”, embora saiba que não seja dono de nada, apenas para marcar os laços de afeto que me unem ao lugar que escolhi para viver por mais de 20 anos da vida vivida até hoje, ou seja, metade dela! Atendendo ao chamado de uma liderança indígena Kadiwéu, voltei à aldeia onde morei e trabalhei por quase uma década, localizada em terras do município de Porto Murtinho, onde minha mãe foi criada, e regionalmente conhecida como “Campo dos Índios”. Sendo professor dos Kadiwéu ensinei-lhes História e Língua Portuguesa, além de outros componentes curriculares escolares, e aprendi tanto com os indígenas Kadiwéu, Kinikinau e Terena com quem convivi, creio que mais do que tenha ensinado a eles. Como esquecer dos sábios anciãos que me deram tantos conselhos e puxões de orelha, além de suas bênçãos? Como não me emocionar ao reencontrar ex-alunos agora adultos, alguns com filhos, me dizendo do quanto se sentiam honrados por terem sido meus aprendizes em passado recente? A nostalgia tomou conta de meus pensamentos e sentimentos e as saudades dos que já partiram para a terra dos sonhos – e cujos nomes em Kadiwéu jamais deverão ser novamente pronunciados pelos viventes – eram enormes. Nascido e criado em São Paulo, capital, aprendi a amar Mato Grosso do Sul e suas gentes. Aqui me graduei e me tornei mestre em História; realizei trabalhos junto a diferentes populações indígenas (Atikum, Guató, Kadiwéu, Kamba, Kinikinau, Terena e Ofayé) os quais me deram honra e satisfação. Além de prêmios (Victor Civita 2001 – Professor Nota 10; Educar para a Igualdade Racial e Étnica 2004 – Ensino Médio; Péter Murányi 2009 – Educação), a convivência com os indígenas me proporcionou experiências únicas e rendeu muitas “histórias de admirar”, vividas e ouvidas. Além de parentes, tenho amigos espalhados por todos os quadrantes do Estado, que sempre me recebem com carinho e atenção quando o visito. Já vivi em Campo Grande, Três Lagoas, Nova Andradina, Dourados, Porto Murtinho, Aquidauana, Bodoquena e conheço praticamente os quase 80 municípios sul-mato-grossenses localizados em diferentes biomas (Pantanal, Cerrado, etc.). A fronteira sempre me fascinou, desde criança, e penso que por isso me dediquei ao estudo e à compreensão das gentes e dos lugares fronteiriços, índios e não índios, especialmente nos últimos anos. Os rios Paraguai e Paraná conformam a área reconhecida por alguns como “Mesopotâmia” do Centro-Sul brasileiro. Terra de águas, de seres encantados das águas e dos que acreditam na força destes seres. Como esquecer das canções e das paisagens que inspiraram verdadeiras joias da música de um lugar de natureza tão exuberante? “A pujança e a grandeza/ De fertilidades mil/ São o orgulho e a certeza/ Do futuro do Brasil”. Hoje, ainda que morando no Amapá, posso lhes afirmar que sinto orgulho por ser filho (adotivo) de Mato Grosso do Sul e que tenho a certeza de ter feito a melhor escolha de um lugar para recomeçar! Sempre!